O Executivo no
Judiciário
Leitura resumida do
Relatório do CNJ (2012, 2013 e 2014)
Marcos Carnevale
O
Relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nos anos de
2012 (referente a movimentação processual de 2011), 2013 (referente a
movimentação processual de 2012) e 2014 (referente a movimentação de 2013),
excetuado o STF, muito bem permite demonstrar que o congestionamento do Poder
Judiciário deve-se ao excesso de processos originários do Poder Executivo e não
propriamente do cidadão litigante que busca seus direitos.
Em
nossa tese defendida no IUPERJ, de cuja banca participaram os professores
doutores Aurélio Wander Bastos
(orientador), Luiz. Werneck Vianna e Fernando Vieira, demonstramos muitos
dos aspectos que não aparecem em uma leitura linear dos dados. Os cruzamentos que foram efetuados dão uma
dimensão muito mais profunda do que a simples leitura quantitativa.
Os
dados desta pesquisa do CNJ permitem demonstrar que, o que congestiona o
funcionamento do Judiciário brasileiro, não é o alto volume de cidadãos
litigantes, como inicialmente se tem levantado, mas o grande volume de ações
promovidas pelo Poder Executivo na área fiscal, geralmente tendo no polo
passivo os cidadãos. A leitura dos dados demonstra que, a Justiça em geral tem
uma evidente função arrecadatória provocada pelo Poder Executivo, em qualquer
de seus níveis. Por outro lado, os dados também demonstram a carência de
magistrados, especialmente de 1º grau, onde se encontram o maior volume de
processos.
Verifica-se
que tramitam na Justiça Brasileira atualmente cerca de 95 milhões de processos,
o que significa que, para cada 2 (dois) brasileiros há 1 (um) processo em
andamento, uma taxa excessiva em relação a outros países. Somente na Justiça
Estadual de São Paulo e do Rio de Janeiro tramitaram 27% e 11%,
respectivamente, destes 95 milhões de casos.
Deste
total de processos (Relatório de 2013) 78% (74,1 milhões) são (foram) de
competência da Justiça Estadual (JE); 12% (11,4 milhões) da Justiça Federal
(JF); 8% (7,6 milhões) da Justiça do Trabalho (JT); e, finalmente, uma
quantidade ínfima, 2%, nos demais tribunais (Justiça Eleitoral, Justiça
Militar, STJ, STM, TSE e TST).
Atualmente
a Justiça Estadual tem 11.960 magistrados, o que significa que cada um deles
tem sob sua responsabilidade uma média de 6.195 processos. A Justiça Federal
possui 1.714 magistrados, com uma carga de trabalho de 6.651 lides. E,
finalmente, a Justiça Trabalhista tem 3.250 magistrados, para decidirem em
média 2.338 processos.
Tomando
como referência os dados supra, considerando que o ano judicial para os
tribunais tem 10 meses úteis, que cada mês, em média, tem 20 dias úteis, ou
seja, em 200 dias de trabalho, cada juiz da Justiça Estadual no Brasil deveria
decidir uma média de 31 processos por dia, ou seja, julgar 3,4 processos por
hora, trabalhando 9 horas por dia. No que se refere a Justiça Federal, cada
magistrado deveria julgar em 200 dias 33,2 processos por dia, e, por hora, 3,7
processos, trabalhando as mesmas 9 horas. E, na Justiça do Trabalho, o quadro
tem uma inversão relevante, pois, em 200 dias de trabalho, cada magistrado
julgaria por dia 11,7 processos, e tomando como referência 9 horas de trabalho,
1,3 por hora.
A
quantificação torna visível a situação numérica dos tribunais, mas é
humanamente impossível alcançar estes resultados, pois os magistrados têm que
participar das sessões públicas, de atividades burocráticas, entre outras ações
que lhes são designadas.
Do
total das ações da Justiça Estadual, os indicadores do CNJ demonstram que 43%
(31,8 milhões) dos 74,1 milhões de processos são de execução fiscal no 1º grau,
verificando-se que os grandes litigantes são o Estado e o Município, que tem a
iniciativa da ação, e não o cidadão, que aparece como réu. Este percentual
torna-se mais grave no Rio de Janeiro, pois do total 62% são execuções fiscais,
e em São Paulo 52%. Logo, o que contribui para emperrar a máquina judiciária
estadual é o próprio Poder Público.
Esta
hipótese final se confirma, verificando-se que, na Justiça Federal, 39% (4,4
milhões) do total de processos de 11,4 milhões também são execuções fiscais,
mantendo-se a mesma linha dos Estados e Municípios. Esses dados permitem
mostrar que, o litigante cidadão não é exatamente aquele que congestiona o
funcionamento judiciário, mas, o Poder Executivo em todos os seus níveis,
cobrando impostos.
Outra pesquisa
do DPJ-CNJ de 2011 aponta quem são os maiores litigantes a nível nacional,
indicando que estão envolvidos nos processos: setor público federal (38%);
bancos (38%); setor público estadual (8%); empresas de telefonia (6%); setor
público municipal (5%); e outros litigantes (5%). Sobre estes números o DPJ informa
ainda que, do total, estão no polo ativo, ou seja, como autores das ações:
setor público federal (33%); bancos (45%); setor público estadual (28%);
empresas de telefonia (22%); setor público municipal (97%); e outros litigantes
(49%).
Esta pesquisa
de 2011 nos permite inferir que, hoje, aplicados estes percentuais, e somados
os cinco maiores litigantes do país, estes são autores em, pelo menos, 36,1
milhões de processos, mais de 1/3 das ações em todo o país.
Por
fim, do total de 16.429 magistrados (Relatório CNJ 2014), tomando como
referência a relação juiz/processo da Justiça do Trabalho em 2013, ou seja, 1
juiz/2.338 processos por ano como carga de trabalho, a Justiça Estadual no
Brasil deveria ter 31.693 magistrados, e a Justiça Federal deveria ter 4.876
magistrados.
Esses dados,
dessa forma demonstram que: é imprescindível uma eficiente formatação da
política de execução fiscal no Brasil; além do Poder Público, os maiores
setores da economia (bancos e telefonia) são responsáveis por milhões de
processos como autores; que há carga de trabalho desigual nas mãos dos
magistrados brasileiros. Fatores estes que contribuem para o congestionamento
do Judiciário.
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